quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O mundo de Sofia


Era uma noite comum, como todas as outras, daquelas em que nada acontece...
O relógio já marcava 23:00 horas de uma noite chuvosa de sábado.
Aquela chuva que te pega desprevenida e você acaba se molhando por inteira.
Acabara de chegar em casa, ensopada e cansada de um dia inteiro de trabalho. Era jornalista, tinha uma coluna semanal sobre política em um jornal da cidade.
Morava sozinha, em um apartamento modesto, com dois quartos, arquitetado como se um dia tivesse o prazer de preencher aquele quarto com uma família, que sonhava construir.
Porém, era sozinha, nem contava mais os anos e já acreditava que ser sozinha seria seu destino. Era solitária em seus pensamentos, em sua cama vazia, em seu coração vazio. Não por acaso. Tinha o coração marcado de romances falidos.
Acendeu a luz do seu apartamento e tudo o que precisava era se secar, livrar-se de um possível resfriado. E tomar um banho quente para relaxar toda a musculatura tensa de uma jornada de trabalho. Resolveu ligar o rádio. Estava tocando “All by Myself” da Céline Dion.
“Irônico”, ela pensou. Mais uma vez o destino pregava uma peça.
Sentou-se no sofá, e a melodia da canção lhe levou para um momento importante da sua vida. Um momento onde o vazio não existia, onde de fato, era feliz. E sim, era feliz. Porque o tinha. Lembrou de quando o conheceu, do riso bobo e meio de canto da boca quando ele perguntara o seu nome.
“Sofia”, respondeu com os olhos brilhando, e sem saber o porquê, com o coração palpitando acelerado.
Se perdendo pelas lembranças, logo lembrou do dia em que se beijaram, do dia em que sentiu o cheiro e o sabor daquele homem.
Aí vieram os jantares, os dias e noites de amor, tórridos, ardentes, inesquecíveis. Aí vieram os planos, os sonhos compartilhados, as cobranças, e...
Nesse instante, o belo se desfez em uma fração de segundos. As lembranças boas não foram suficientes para sustentar a dor que tinha passado.
Uma lágrima correu-lhe pelo rosto, e misturou-se com as gotas d’agua que ainda encharcavam seu corpo.
Lembrou do fim.
De súbito, correu para a geladeira, na procura de algo que preenchesse sua vida. Um pouco de emoção, serotonina, gordura trans, carboidratos, algo que pudesse ser útil nesse momento.
Encontrou um pote de sorvete que havia comprado semana passada.
Olhou para o céu e disse em voz alta: “Qual é? como se minha vida já não fosse um clichê ambulante...” e riu de si mesma.
Se enchendo de sorvete, começou a acompanhar a canção no rádio, cantando em alto e bom som, enquanto chorava.
“All by myseeeeelf, don’t wanna be, all by myseeeeeelf. Anymoooore”.
E lembrou-se, mais uma vez, de tudo que havia passado. Do término, do adeus.
[...]
Após alguns minutos, percebendo a cena ridícula do “Diário de Bridget Jones” que acabará de recriar, levantou-se apressada e guardou o sorvete novamente na geladeira. Engordar não seria um problema a mais na sua vida. Ela não iria permitir.
Enxugou as lágrimas com as mangas do seu casaco e desligou o rádio. Sua vida não iria parar por aquilo, tampouco os problemas iriam se resolver daquele jeito.
Foi pro seu escritório, abriu o notebook.
Lembrou que tinha um artigo para terminar.